quinta-feira, 14 de junho de 2012

pH de 32 águas minerais brasileiras

Comunicação



Águas minerais de algumas fontes naturais brasileiras

M. A. P. Rebelo, N. C. Araujo



Ambulatório de Litíase Renal, Disciplina de Nefrologia, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Faculdade de Clínica Médica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, RJ.





RESUMO ¾ Paciente de litíase renal é estimulado a aumentar a ingestão hídrica, principalmente na forma de água tratada da torneira, pela irrelevante biodisponibilidade de minerais em sua composição. O benefício é atribuído à redução da saturação dos sais urinários. Não está claro se as águas minerais naturais comercialmente disponíveis também é benéfica.
OBJETIVO. Divulgar as informações sobre as características químicas e físico-químicas de águas minerais naturais de algumas das diversas fontes brasileiras. Essas informações serão de utilidade na análise de protocolos de pesquisa e na orientação do paciente.
MÉTODOS. Foi feito uma coletânea das informações que constam nos rótulos de garrafas de águas minerais naturais, predominantemente não-gasosas, acessíveis ao consumo carioca. A partir da composição salina provável, foi calculada a concentração iônica de cada mineral.
RESULTADOS. Foram estudadas as informações de 36 fontes situadas em alguns estados brasileiros. O pH, a 25ºC, variou de 4,1 a 9,3 na dependência da fonte e foi linearmente correlacionado com as concentrações dos cátions cálcio, magnésio, sódio e do anion bicarbonato. Isto foi atribuído à alta alcalinidade desses sais, que contêm cerca de 70% de bicarbonato na molécula. Os teores de cálcio (0,3 a 42 mg/l), de magnésio (0,0 a 18 mg/l) e de bicarbonato (4 a 228 mg/l) foram considerados relativamente baixos.
CONCLUSÃO. O teor mineral das fontes brasileiras que compuseram esse levantamento é baixo, com cerca de 70% delas apresentando teores de cálcio e de magnésio abaixo de 10 mg/l e 1 mg/l, respectivamente, semelhantes ao da água tratada da torneira.

UNITERMOS: Águas minerais naturais. Cálcio. Litíase renal.





INTRODUÇÃO

É comum ao profissional que lida com litíase renal ser abordado sobre a existência de algum prejuízo em substituir a ingestão de água potável "da torneira" pela água mineral natural no controle preventivo da formação de cálculo. Essa questão ainda não está clara. É regra estimular a ingestão hídrica para promover a diluição urinária e conseqüente queda na concentração dos elementos formadores de cálculo, dando-se preferência à água potável pela irrelevante biodisponibilidade de minerais em sua composição. Por exemplo, em uma das estações de tratamento de água para o consumo no Rio de Janeiro, os teores de cálcio e de magnésio, após o tratamento, são abaixo de 10 mg/l e de 1mg/l, respectivamente. O mesmo não se pode dizer para as águas minerais naturais.

Estão surgindo na literatura resultados de estudos que avaliaram o efeito da ingestão dessas águas sobre os fatores de risco da litíase renal. Di Silvério et al. não observaram diferença de composição urinária quando a água potável foi substituída pela água mineral,1 o contrário do observado por outros investigadores que apontam ser a água mineral muito mais efetiva na redução dos fatores urinários litogênicos em comparação com a água potável tratada2-6. Essa aparente contradição deve estar relacionada ao fato de que, variando-se a fonte de água mineral natural, o conteúdo mineral também é variado.

Em artigos recentes, alguns investigadores mostraram os efeitos benéficos de uma dieta restrita em cálcio (400mg/dia) suplementada com água mineral de alto teor em cálcio (2 litros de água mineral com 10mmol/l, ou seja, cerca de 400mg de cálcio/litro). Apesar de um modesto aumento na calciúria, houve redução significante da saturação urinária para oxalato de cálcio, ácido úrico, brushita, elevação significante da citratúria e do pH urinário e paralela redução significante no turnover ósseo2,3, sem incorrer no aumento de ingestão de proteína e de sódio como seria, caso essa mesma quantidade de cálcio fosse suplementada com produtos derivados do leite. Em comparação com a ingestão da água tratada, tem sido uma constante a observação de que as águas minerais de alto teor em cálcio (e de magnésio) aumentam a excreção urinária de citrato (e magnésio) e reduz a oxalúria tendo, portanto, um potencial benéfico no controle da nefrolitíase2-6.

No que se refere ao metabolismo ósseo, Meunier et al. já haviam atribuído o aumento da densidade mineral óssea da vértebra lombar à ingestão continuada de água mineral de alto teor em fluor7.

O objetivo deste trabalho é divulgar as informações de composição química e de algumas características físico-químicas de águas minerais naturais de algumas fontes brasileiras, as quais poderão ser úteis em protocolos de pesquisa da litíase renal e conseqüente orientação ao paciente.



MATERIAL E MÉTODO

Foram coletadas as informações de composição química provável, em mg/l, e características físico-químicas (pH e resíduo pós evaporação a 180 ºC) que constam em rótulos das águas minerais engarrafadas de fontes naturais e disponíveis no mercado carioca. Foi dado preferência para as não-gasosas por estarem mais próximo à informação dos rótulos por ocasião da sua ingestão.

Em seguida foi calculada a quantidade de cada íon ou espécie iônica em mg/litro, com base nos seus respectivos percentuais na molécula do sal (Tabela 1), conforme a seguinte fórmula: x , mg/l = s (mg/l)* x %, onde x é a concentração do íon no sal (cátion ou ânion) em mg/l; s a concentração provável do sal que consta no rótulo em mg/l e x% a percentagem do íon em estudo na molécula do sal (Tabela 1).










RESULTADOS E COMENTÁRIOS

Foram analisadas as informações de 36 fontes naturais de água mineral, situadas no Estado do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia, em sua maioria disponíveis para o consumo carioca.

O pH da água na fonte, a 25ºC, variou conforme a fonte, de 4,10 como a Açaí no Estado da Bahia e a Raposo no Estado do Rio de Janeiro, até 9,35 em uma das fontes de Serra Negra, no Estado de São Paulo. O pH se correlacionou positiva e significantemente com a concentração dos cátios cálcio (r= 0,45; n=36; p<0,01), magnésio (r= 0,68; n= 35; p<0,001) e sódio (r=0,35; n=36; p<0,05) e ânio bicarbonato (r=0,49; n=36; p<0,01). Essa correlação positiva é devido a maior alcalinidade desses sais, com mais de 70% de bicarbonato fazendo parte da molécula (Tabela 1) e a maior quantidade dos mesmos na composição das águas mais alcalinas. O resíduo pós evaporação a 180ºC, que deve representar o "peso seco" da massa mineral da água, também se correlacionou positiva e significantemente com o pH (r= 0,46; n=36; p<0,01). Como esperado, encontramos uma correlação positiva e significante entre o resíduo mineral e as espécies iônicas predominantes como o Ca++ (r: 0,66; n: 36; p<0,001); Mg++ (r: 0,72; n:35; p<0,001); Na+ (r: 0,93; n:36; p<0,001); Sr++ (r: 0,57; n:23; p<0,01) e K+ (r: 0,38; n: 34; p<0,05); HCO3- (r: 0,97; n: 36; p<0,001) e SO4-2 (r: 0,84; n: 23; p<0,001) e F- (r: 0,60; n: 13; p<0,05).

Nas informações coletadas, verifica-se que, de uma maneira geral, as águas têm um baixo teor em cálcio, o qual variou de 0,3 a 42,1mg/l, conforme é visto na Tabela 2 e, também, baixo teor em bicarbonato, variando de 4 a 228mg/l, o que eqüivale a menos de 4mEq/l na de maior conteúdo desse elemento (Tabela 3). O conteúdo de magnésio variou de traços indosáveis a 18mg/l.













Com base nesse levantamento, os dados mostram que nossas fontes de águas minerais diferem bastante das descritas em outros mercados, como o Europeu, que dispõem de águas muito mais ricas em cálcio e em bicarbonato. A Perrier, de fonte francesa, bastante consumida entre nós, indica ter concentrações bem mais altas de cálcio (147,3mg/l) e de bicarbonato (390mg/l), do que as que compuseram este relato.

Diante dessas informações, os autores sugerem que se faça uma coletânea que abranja todas as fontes já analisadas e disponíveis no mercado brasileiro para se concluir que as águas minerais de nossas fontes têm um teor em cálcio bem mais baixo do que as dos artigos estrangeiros referendados.





SUMMARY
Mineral waters from brazilian natural sources
PURPOSE. To divulge information on the chemical composition and physical-chemical features of some mineral waters from Brazilian natural sources that will be of useful protocol in vestigation and patient advice.
METHODS. The survey was based on bottle labels of non-gaseous mineral waters commercially available in the city of Rio de Janeiro. The íon concentration of each mineral was calculated from the salt content.
RESULTS. 36 springs were enralled from different states of the country. The pH (25ºC), 4.1 to 9.3, varied on dependence of the source and it was linearey correlated with the cations calcium, magnesium and sodium and the anion bicarbonate. It was atributed to high alkalinity (about 70% of bicarbonate in the molecula-gram) of these salts. The calcium (0.3 to 42 mg/l), magnesium (0.0 to 18mg/l) and bicarbonate (4 to 228 mg/l) contents are relatively low.
CONCLUSION. The mineral content of the Brazilian springs enrolled in this survey is low; about 70% of the sources having calcium and magnesium less than 10 mg/l and 1.0 mg/l, respectivelly, similar to local tap water. [Rev Ass Med Brasil 1999; 45(3): 255-60]
KEY WORDS: Mineral waters. Calcium. Nephrolithiasis





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Di Silverio F, D'Angelo AR. The prevention of renal calculosis: efficacy of Fiuggi water cure. Research Group on Renal Calculosis. Arch Ital Urol Androl, 1994, 66; 5:253-8 [ Links ]
2. Ackermann D, Baumann JM, Futterlieb A; Zing EJ. Influence of calcium content in mineral water on chemistry and crystallization conditions in urine of calcium stone formers. Eur Urol 1988; 14: 305-9. [ Links ]
3. Marangella M, Vitale C, Petrarulo M, Rovera L, Dutto F. Effects of mineral composition of drinking water on risk for stone formation and bone metabolism in idiopathic calcium nephrolithiasis. Clinical Science 1996; 91: 313-18. [ Links ]
4. Rodgers AL. Effect of mineral water containing calcium and magnesium on calcium oxalate urolithiasis risk factors. Urol Int 1997, 58; 2: 93-9. [ Links ]
5. Gutenbrunner C, Gilsdorf K, Hildebrandt G. The effect of mineral water containing calcium on supersaturation of urine with calcium oxal ate. Urologe [A], 1989, 28; 1:15-9. [ Links ]
6. Sommariva M, Rigatti P, Viola MR. Prevention of the recurrence of urinary lithiasis: mineral waters with high or low calcium content? Minerva Med 1987, 78; 24: 1.823-29. [ Links ]
7. Meunier PJ, Femenias M, Duboeuf F, Chapuy MC, Delmas PD. Increase of vertebral bone density in heavy drinkers of mineral water with a high fluoride content. Presse Med, 1989, 18; 29:1.423-6. [ Links ]

Um comentário:

  1. FONTE:

    Electronic Document Format(ABNT)
    REBELO, M. A. P.; ARAUJO, N. C.. Águas minerais de algumas fontes naturais brasileiras. Rev. Assoc. Med. Bras.,  São Paulo,  v. 45,  n. 3, July  1999 .   Available from . access on  14  June  2012.  http://dx.doi.org/10.1590/S0104-42301999000300011.

    ResponderExcluir